Por Martha Rocha[1].
Acho que esse título já existe em um livro, artigo, dissertação ou qualquer outro tipo de trabalho científico. Se não existe, é porque existe no imaginário de pessoas que estudam, discutem ou experienciam o trabalho em comunidades onde se vê o embate/debate entre a manutenção dos padrões tradicionais a experiência da modernização por meio de empreendimentos que ali se instalam.
Tenho pensado nisso desde que participei do Programa de Desenvolvimento Sustentado da Costa dos Coqueiros (1998-2003), do instituto de Hospitalidade. De lá prá cá, não consigo mais trabalhar em nada que não tenha em si pelo menos o germe da sustentabilidade, essa palavrinha que aproxima e assusta; que é perseguida por alguns e odiada por outros. Isso porque, na minha modesta opinião, a sustentabilidade não é algo simples de conseguir. Ser sustentável não é tão fácil quanto plantar novas árvores no lugar de árvores derrubadas para a construção de um prédio qualquer; não é tão direto quanto dizer às crianças que não dá prá passar sabonete com o chuveiro ligado, porque todo mundo vai ficar sem água um dia; não é tão moderno quanto assinar abaixo-assinados digitais contra o desmatamento da Amazônia.
As primeiras discussões sobre Desenvolvimento Sustentável se expressam no Relatório “Nosso Futuro Comum”, produzido pela Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (CMMAD), criada pela Assembléia Geral da ONU de 1983 e presidida por G. Harlem Brundtland. O documento, mundialmente conhecido como “Relatório Brundtland”, partia da preocupação, já existente naquele momento, com o esgotamento dos recursos naturais, por conta da degradação ambiental, fruto do uso indiscriminado dos mananciais e matérias-primas, e como exigência da complexificação tecnológica, já bastante perceptível então. O grande problema dessa perspectiva era que se partia do princípio de que o “primeiro mundo” deveria servir de exemplo para o “terceiro mundo”.
Em 1992, forma-se a Comissão Mundial de Cultura e Desenvolvimento, a partir de iniciativa da UNESCO e da ONU, no sentido de repensar a questão do desenvolvimento. Essa comissão, presidida pelo então Secretário Geral das Nações Unidas, Javier Pérez de Cuéllar, produziu um relatório chamado “Nossa Diversidade Criadora”, que apresentava a seguinte tese fundamental:
... o desenvolvimento compreende não apenas o acesso a bens e serviços, mas também a possibilidade de escolher um estilo de coexistência satisfatório, pleno e agradável. Em uma palavra, o desabrochar da existência humana em suas várias formas. Os bens e serviços presentes na visão convencional e estreita do desenvolvimento só têm valor porque contribuem para nossa liberdade de viver de acordo com nossos próprios valores. A cultura, por conseguinte, mesmo tendo em vista sua importância como instrumento do desenvolvimento (ou obstáculo a ele), não pode, em última instância, ser reduzida à posição subsidiária de mera promotora (ou freio) do crescimento econômico[...]. O desenvolvimento e a economia são, pois, aspectos da cultura de um povo.
Para se atingir a sustentabilidade, então, é necessário se proceder ao fortalecimento da comunidade, tornando os sujeitos que aí se localizam, cidadãos capazes de gerir seus destinos, na condição de “comunidade sustentável”.
Sustentabilidade é tudo isso e mais. Penso que buscar a sustentabilidade é começar a entender verdadeiramente que o meio ambiente inclui pessoas, cultura e, principalmente, história e participação política; é entender que o ser humano é total, inserido num território que também é parte desse homem.
Enfim: sustentabilidade é equilíbrio entre o tradicional e o moderno, entre aquilo que dá sentido a nossas vidas (nossas memórias, nossos antepassados, nossa cultura) e aquilo em que queremos nos transformar (nosso bem-estar, nosso trabalho, nosso futuro). E isso é super difícil de alcançar.
[1] Martha Rocha
Mestre em Sociologia do Trabalho e especialista em metodologia de pesquisa. Professora universitária e pesquisadora, tendo atuado em diversos projetos de intervenção para geração de trabalho e renda. Atualmente coordena trabalho de mobilização social em São Francisco do Conde, onde deverá ser implantado um eco-resort (Ilha de Cajaíba), pela Property-Logic do Brasil.
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